João Grandino Rodas

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"Em toda a minha vida năo tem havido monotonia nem compasso de espera. Face ao tempo relativamente pequeno da vida útil do ser humano e a imensidade que se tem para realizar, a única saída é acelerar em crescendo!"

João Grandino Rodas: O orçamento da USP

Publicado por joao | Categoria artigos, blog

A nova gestão da Reitoria da USP completa seu primeiro ano. Foram 24 dias de transição e o restante, de mandato. Nesse período, o que ocorreu na universidade mais conceituada do país?

Figurativamente, o transatlântico que é a universidade foi bruscamente parado por seus gestores centrais, sob a alegação de estar falida. Acusaram a gestão anterior de ter levado a universidade à bancarrota, pela imprensa e durante visitas a autoridades, antes da conclusão de verificações. Caçaram bruxas e buscaram o bode expiatório.

Embora partícipes da anterior gestão –com mandato–, alegavam, candidamente, nada saber, em uma demonstração flagrante de incúria ou de falta de ética. Procederam ao desmonte da universidade, anunciando vendas e cessões. Intolerância perdulária foi gastar dinheiro para desfazer as salas de recepção da Reitoria, empacotando e armazenando quadros, móveis e obras de arte doadas à universidade!

Uma das tônicas foi dividir a universidade. Após tratar como inimigos os que não militaram com eles na campanha, demonizando-os, passaram a minimizar o funcionalismo técnico-administrativo (que não apoiou o atual reitor na prévia), dizendo que o plano de carreira adotado na gestão anterior havia sido uma maneira de apaziguar o sindicato e acabar com greves.

Isso apesar de os dirigentes saberem se tratar de um direito e eles próprios terem votado a favor no Conselho Universitário.

Sabem eles, ademais, que o fato de alguns funcionários ganharem mais do que alguns professores se deve à conjuntura de os professores da USP receberem menos que seus congêneres das federais –mais cedo ou mais tarde, o Cruesp (Conselho dos Reitores das Universidades Estaduais Paulistas) fará essa necessária correção.

Negaram-se a corrigir pela inflação os salários na data base (período anual de renegociação do contrato de trabalho) como ocorreu com os demais trabalhadores brasileiros. Na universidade, em que a tônica deve ser a diversidade, bem como o respeito a ela, o lema passou a ser quem não está comigo está contra mim e deve ser destruído.

O resultado disso vem sendo dolorosamente colhido pela USP, que está dividida, acuada e desesperançada! Enfrentou histórica greve de quatro meses, a maior de seus 80 anos, patrocinada por todos os segmentos: alunos, funcionários e professores. Viu a Justiça do Trabalho obrigá-la a pagar a correção salarial, inclusive no tempo da paralisação. Perdeu o lugar de primeira universidade latino-americana para a Universidade Católica do Chile.

E, para coroar, houve diminuição substancial do número de inscritos na Fuvest, revertendo a tendência de subida dos anos anteriores. Enquanto isso, nesse ano, a Unicamp e a Unesp tiveram aumento nos inscritos em seus vestibulares.

O intuito dessas minhas palavras não é corrigir mentiras ou completar meias verdades. Até porque já é do conhecimento público que a falência da USP nunca existiu, pois havia reservas orçamentárias no valor de cerca de R$ 3 bilhões e meio, dos quais R$ 1, 5 bilhão totalmente descompromissado.

Sindicância realizada comprovou que tais reservas eram muito superiores aos encargos presentes e futuros a pagar (sobrando até para pagar, os salários corrigidos durante a greve, além dos quatrocentos milhões de reais do famigerado e inútil plano de demissão voluntária). Comprovou também que o atual reitor, terminada a eleição, desclassificou a “falência” para “crise econômica” e afirmou ter sido ela resolvida (embora sem novos aportes recebidos pela USP).

Exorto que a USP tome medidas administrativas necessárias para enfrentar a recessão econômica, presente e comum a todas as instituições públicas e privadas do Brasil, de forma lógica e coerente.

Da mesma forma como vêm fazendo a Unicamp e a Unesp, que possuem problemas similares inclusive no tocante ao Tribunal de Contas do Estado, sem apelar para inexistente “herança maldita” e clamor excessivo, que pôs abaixo a credibilidade da universidade.

Em suma, os paulistas, que financiam a Universidade, esperam que a atual gestão comece a pôr em prática o slogan de sua campanha: “Todos pela USP”. Assim, nossa Universidade poderá sair da deriva e almejar um feliz 2015.

JOÃO GRANDINO RODAS, 69, é professor titular decano de direito e ex-reitor da USP (2010 a 2014)

Publicado em: http://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2014/12/1567588-joao-grandino-rodas-a-usp-em-2014.shtml

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dezembro 29th, 2014

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